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26-11-2014 11:30

Apologia do plurilinguismo no meio empresarial


Francois-Paymal-UE
Da minha experiência como formador em línguas no meio empresarial da zona de Lisboa, gostaria de salientar como, neste contexto de crise económica global, onde Portugal da União Europeia é a primeira vítima, as empresas portuguesas conseguem, apesar de tudo, crescer numa política renovada de exportações de produtos e serviços.


O meu objetivo não passa por analisar estratégias complexas de marketing, mas apenas demonstrar que o uso de várias línguas estrangeiras num departamento de uma organização empresarial pode ser, do ponto de vista concorrencial, uma mais-valia determinante para tecer e fomentar relações comerciais a longo prazo e, assim, preservar pólos de emprego para milhares de famílias que vivem em Portugal.

Vou apresentar dois casos onde a prática da língua francesa, que apenas há dez anos atrás era considerada uma língua exclusivamente literária, até mesmo requintada no charme de Eça de Queiroz, se tornou numa crescente chave de sucesso para alguns niches de marchés, uma ferramenta ad hoc à frente para clientes específicos.

O primeiro caso é o da multinacional portuguesa Sumol Compal, leader nos soft drinks e sumos em Portugal e, o segundo, é o da empresa de consultoria ROFF, especializada na implementação do sistema Entreprise Ressource Planning E.R.P. SAP, também ela liderante no mercado nacional.

1. Através da língua francesa, a Sumol Compal, consegue desenvolver novos mercados no continente africano
Esta empresa é leader no mercado nacional português na produção e comercialização de sumos, soft drink, águas com ou sem gás, legumes enlatados. Detendo um portefólio abrangente, após a fusão da Sumol e Compal (S+C), em 2008, conseguiu estabelecer uma excelente relação qualidade preço, sempre com um packaging inovador, alegre e adaptado ao público-alvo.
Consciente das limitações do mercado nacional, a direção apostou no crescimento do mercado internacional, estando presente em mais de 60 países, seja com exportações, seja com a implementação de unidades de produção nos PALOPS, numa politica complexa entre fornecedores de matérias-primas e vendas nas respectivas comunidades, pesem, embora, as altas taxas alfandegárias.

No departamento das exportações, constituído por uma equipa jovem e poliglota, cada setor geográfico de exportação tem o seu especialista, que muitas vezes sabe falar a língua materna do seu correspondente. Assim, no caso do continente africano, sejam Costa de Marfim, Argélia, Camarões, Congo ou Marrocos ou outros, todas as comunicações orais ou escritas se desenrolam em francês, um francês vivo e rico das especificadas fonéticas, tranformando o opened space do serviço das exportações de S+C numa autêntica montra do mundo.

A prática de uma língua estrangeira é, para o exportador, a revelação de uma cultura onde, cada vez que ele fala, estabelece um ritual de convivialidade e, consequentemente, uma relação de confiança na partilha de um portefólio rico e capaz de responder às especificidades dos gostos dos consumidores. A um nível mais humanístico, é uma verdadeira tomada de consciência dos preconceitos sobre as culturas diferentes da nossa. Ao deixar outras culturas entrar no nosso referencial cultural ocorre um enriquecimento pessoal, assim como nos permite contactar com outras mundividências.

Por fim, a mensagem que chega ao consumidor também é melhorada. Claro! Na apresentação do produto, assim como no packaging, ao invés de ler nove línguas de forma ilegível, é a língua materna do consumidor que prevalece. De maneira geral, não sei se uma multinacional inflexível na escolha de uma língua de trabalho exclusiva, poderá vir a desenvolver, com sucesso, niches de marché no continente africano.

No caso da S+C, a língua francesa é uma mais-valia nas relações comerciais através da adaptação à cultura local do consumidor. Já com a ROFF, a língua francesa torna-se uma necessidade não só comercial mas, sobretudo, uma necessidade técnica, onde a qualidade da comunicação com os protagonistas do pessoal da empresa-cliente é fundamental, tanto na implementação de um E.R.P.SAP, como na sua manutenção.

2. Com a língua francesa, ROFF tem um desempenho minucioso na implementação e manutenção de ERP Enterprise Resource Planning
Ao optar por um sistema informático integrado, a empresa tem uma visibilidade da sua atividade, em tempo real, pela centralização dos seus dados num servidor único. No caso do sistema SAP, adquirindo vários módulos ( sendo os principais: Modulo MM, logística, PP gestão da produção, SD administração das vendas, FI escritura das vendas e compras…), a empresa pode planear e gerir toda a sua produção e comercialização e explorar de maneira coerente milhares de dados visando a melhoria da sua produtividade. Numa imagem ousada, o ERP (progiciel, em francês) seria, na entidade empresarial, o conjunto do sistema de nervos e do cérebro.

Mas, a implementação de um ERP exige dos consultores, não só o conhecimento do ramo da atividade do cliente, mas também a aptidão para uma compreensão fina das dinâmicas e da filosofia da empresa que viabilize uma tradução ad hoc em termos técnicos das exigências do cliente. Assim, é fundamental uma boa comunicação com os utilizadores-chave na fase montante do projeto (Business Blue Print dito BBP), assim como do ensino no uso do sistema SAP. O consultor deve saber ouvir, perceber e explicar, às vezes no imediato e no local com o próprio cliente, outras vezes de forma mais remota. ROFF acabou de ganhar o prémio Parceiro do Ano na região da África francófona (em 22/10/2014) e julgo que tal se deve, não só ao seu talento técnico mas, também, à linguística dos seus consultores e a uma equipa que interage constantemente através da língua francesa. Por exemplo, com o cliente SIFCA, sedeado na Costa de Marfim e leader no mercado do óleo vegetal borracha natural e açúcar de cana, estabeleceram-se fortes ligações entre as equipas e partilhas interculturais, resultando no sucesso da implementação do projeto. Temos, ainda, de salientar a originalidade e as possibilidades oferecidas pela internet, de forma remota, na manutenção de um sistema ERP, que proporciona uma politica de recrutamento de consultores em Portugal, cujo trabalho é dirigido para entidades nacionais, mas também para fora do país. Os opened spaces das diferentes equipas são uma autêntica Torre de Babel entre o português, o inglês, o francês, o espanhol… Apesar das dificuldades técnicas a resolver num curto prazo, os escritórios tornaram-se no palco das interações culturais que enriquecem a visão humana dos consultores.

Para concluir, com estes dois exemplos da introdução da língua francesa no meio empresarial, para alargar a conquista de numerosos niches de marche, seja no domínio dos soft drink e sumos, seja naquele dos ERP SAP, a pluralidade linguística para as empresas portuguesas é um valor que potencia o fortalecimento e o tecer de novas relações comercias, sempre com um excelente relação preço / qualidade dos seus produtos ou prestação de serviços made in Portugal. O meio empresarial português, de tradição viajante, pode e deve desafiar sem receio as mais importantes multinacionais dos países mais industrializados do mundo, que às vezes são pouco sensíveis às questões culturais. Um profissional, qualquer que seja o seu ramo, ao assimilar várias línguas, recusa o monoculturalismo redutor e pobre, para tornar-se mais humano e recetivo aos outros, sem ocultar a sua própria personalidade. E, isso, também se constitui como uma grande riqueza!


Publicado por François Paymal

Temas: Universidade Europeia, Gestão